Patrícia Lino, 1990
Estamos no final de Agosto e chove. Vejo a Patrícia, o seu sorriso, e uma pesada mochila (que me faz pensar em livros). Encontramo-nos em frente ao Teatro Nacional São João, na praça da Batalha. O dia, cinzento, contrasta com as coloridas e belíssimas ilustrações da Patrícia.*
A Patrícia dá aulas na Universidade de Santa Barbara (Califórnia), onde também é estudante de doutoramento em Literatura Portuguesa e Brasileira. Em Outubro, irá para São Paulo trabalhar durante alguns meses na sua tese. Agora, de férias em Portugal (mas sempre com muito trabalho), tem aproveitado o seu tempo livre para apresentar livros, fazer workshops de ilustração, visitar amigas e amigos. Lisboa, Coimbra, Porto. E, muito brevemente, Aveiro (daí a tão pesada mochila).
Foi na Faculdade de Letras que a conheci. Logo no meu primeiro ano de licenciatura ouvi o seu nome múltiplas vezes: nas salas, no bar, nos corredores. A Patrícia organizava leituras e colóquios. Escrevia e ilustrava. Por mero acaso, ainda assistimos juntos a um seminário de Teoria Estética. Mas, foi só mais tarde, devido a alguns colóquios, que nos ficamos a conhecer melhor.
Sempre que a Patrícia regressa a Portugal, temos por hábito combinar um longo café. Hoje, o programa é ligeiramente diferente. Eu e a Catarina convidámo-la para almoçar num restaurante japonês e beber vinho (português). E, assim, a garrafa de Vicentino Branco 2016 acompanhará um almoço demorado e várias conversas: a vida da Patrícia em Santa Barbara, os seus planos para o futuro, os nossos planos, as suas viagens (México), as nossas viagens (Itália), livros, gastronomia, plantas, terminologias. Desde as questões mais sérias, como a violência de género e a gentrificação, até ao gelado de manteiga de amendoim.
São quase 16h. No restaurante, só nós e o staff, que freneticamente arruma louças e mesas. Conviver com a Patrícia é participar justamente numa experiência temporal invulgar. Lenta, ponderada, meditativa. Antítese total do ritmo contemporâneo, dos horários, da pressa, do rendimento. Quando saímos do restaurante vejo mentalmente um livro de Byung-Chul Han pousado na minha mesa de cabeceira.
O comboio da Patrícia só parte às 17h. Ainda há tempo para um café e para falarmos sobre vinho. Fico a saber que, na Califórnia, a Patrícia bebe ocasionalmente e que gosta mais de vinho tinto do que branco. Recomendo-lhe, portanto, que comece a experimentar alguns Pinot Noir de Santa Barbara, onde o solo e o clima apresentam condições excepcionais para esta uva tão difícil e de baixo rendimento.
Antes de o comboio partir, em São Bento, a Catarina fotografa uma tímida Patrícia, mais habituada a retratar do que a ser retratada. E só agora reparo, coincidência, que nos encontramos num teatro e que nos despedimos numa estação de comboios. Olha que lugares tão curiosos.
*podem acompanhar o trabalho artístico da Patrícia em www.facebook.com/patricialinovisualwork/ e em https://www.instagram.com/patricialino_visualwork/