Carlos Rafael Sousa, 1974
Peculiar o lugar onde decorre esta conversa. São seis e meia da tarde e estamos numa secretária, junto a estantes de livros e filmes, na minha biblioteca. Eu, em frente ao Rafael (é pelo segundo nome que o trato), e a Catarina, ao seu lado. Se virar a cabeça para a esquerda, encontro as prateleiras de Filosofia: Deleuze, Kant, Sloterdijk, tantos outros. Em cima da secretária, rascunhos do meu doutoramento, notas sobre fotografia e três copos do rosé 2016 da AB Valley Wines. Espera-nos um longo jantar (oito pessoas no total; incluindo o já entrevistado Ivan), que acabará com algumas garrafas vazias e uma partida de bilhar.
Mas, agora, momento solene, a entrevista. Embora Carlos Rafael tenha nascido em Luanda, veio logo para o Porto, a cidade que muito admira e onde sempre viveu. No fundo, e como ele diz, foi a Angola apenas para nascer. Anos mais tarde, no Porto, concluiria o curso de Microbiologia na Universidade Católica. É com fascínio que nos fala do ADN, esse maravilhoso “alfabeto da natureza”. E recorda-nos a sua única incursão pelo ramo da microbiologia alimentar, nos tempos em que andava na Católica, através de um projecto que procurava detectar brettanomyces (o famoso “suor de cavalo”) em amostras de vinho. Todavia, acabaria por enveredar pelo ramo da saúde. Desde 1999, trabalha no Laboratório de Anatomia Patológica (LAP), onde é responsável pela Área da Biologia Molecular.
Em relação a vinho, conheço os gostos do Rafael. Já partilhámos diversas garrafas. E foi através do vinho e da gastronomia (ou seja, de jantares vínicos) que nos ficámos a conhecer. E, se o próprio entende a gastronomia como “um dos prazeres da vida”, também o vinho é complemento necessário a essa experiência de convívio e amizade que a mesa permite. Relativamente a vinhos e regiões diz que não resiste a um belo tinto do Douro, dando como exemplo o Tinta Roriz da Quinta do Crasto. Mas nem só no Norte se fazem coisas boas. E, nesse sentido, o Moscatel Roxo da Bacalhôa é outro nome que prefere destacar.
A conversa termina com o relato da viagem recente (em trabalho) do Rafael à Áustria. Parece que, apesar do pouco tempo, seguiu a minha recomendação e bebeu um Grüner Veltliner. E ainda trouxe um colheita tardia de Riesling que partilharemos no fim do jantar. Acerca de outras viagens, fala-nos da mais marcante, a que fez ao Egipto com a sua mulher, Paula. E declara Istambul como uma das cidades mais deslumbrantes em que já esteve. Bebemos mais um copo de rosé. A Catarina fotografa-o em frente às estantes. De copo na mão e livros à volta, não há dúvidas: o Rafael está muito bem acompanhado.